"Existem Venenos Tão sutis que, para conhecer-lhes as propriedades, temos que nos expor ás doenças que causam."

Oscar Wild.

25 maio 2010

Capitulo Dois

Ouço o baque de meus pés no chão, meus olhos permanecem fechados, mas sou capaz de sentir a claridade avançada do dia que se infiltra pela janela, levanto-me do desconfortável sofá e caminho até a cozinha, sinto cada músculo de meu corpo se contorcer de dor a cada mínimo movimento que faço, abro as maciças portas da despensa, café, cigarros.


Aqueço a água enquanto a fumaça do cigarro se instala em meu sistema nervoso relaxando-me instantaneamente, o cheiro da amarga cafeína envolve todo ambiente, enquanto gozava de tal situação um baque surdo se fez audível no andar de cima.
Como que coladas todas as imagens da noite anterior reapareceram em minha mente, o carro, os cabelos de fogo, o edredom.
Apresso-me escadas a cima e entro no pequeno quarto com silencio mais barulhento de toda minha vida, a cama jazia vazia, porem um corpo esquelético e comprido fitava a janela agora aberta com o vento gélido a lhe banhar a carne, o fino vestido colava em seu corpo e não pude deixar de notar que apesar de magro possuía boas curvas e belas coxas, seus cabelos esvoaçavam em minha direção como um mar de pétalas de rosa, o ar continha uma essência a qual julguei ser seu perfume, cítrico porem levemente doce, não era igual a nada que já sentira.
Pigarreei porem o corpo permaneceu imóvel encarando eternamente à feia vista do segundo andar de meu pequeno refugio me aproximei, agora não mais tentando esconder as evidencias de minha existência, pisava de maneira que poderia ser considerada grosseira no piso de madeira esperando assim que minha convidada se virasse em minha direção, não sei por que, mas não desejava tocar sua pele, algo dentro de mim sentia repulsa daquela brancura excessiva, quase mórbida.
Tendo andado quase todo percurso entre o batente e o saco de ossos pousado verticalmente a minha frente, ergui suavemente os braços com precaução de não deixar transparecer o receio que escondia por trás de cada gesto.
As pontas de meus dedos roçaram o tecido azulado que cobria seu ombro ossudo e angular.

-Com licença, você esta bem?

Senti a massa mole de seu corpo derramar-se sobre o assoalho, gemidos de medo e dor se propagavam pelo quarto, dei um passo para trás como que se estivesse me precavendo de qualquer ato que aquela pobre criatura pudesse proferir contra mim, analisando rapidamente a idiotice de meus pensamentos me aproximei suavemente sem tocar-lhe o corpo.

-O que aconteceu com você? - Sua cabeça se levantou e os mortíferos olhos castanhos me penetraram a alma feito milhões de adagas a me destruírem o corpo, nunca poderei exprimir todos os sentimentos expressos em tão pouco contato visual; Dor, medo, raiva, ironia e por fim alivio.

Ao ver meu rosto seus olhos se reviraram nas orbitas e o tronco, antes ereto, despejara-se novamente no chão frio, peguei seu corpo, agora sem mais repulsa da pele azulada que pulsava por entre meus dedos, re-acomodei o pequeno peso por entre as cobertas e desci para tomar meu café, vi o cigarro que antes fumava, exercitando a meditação que a pequena maravilha causava sobre mim, agora atirado no chão e apagado, me arrastei até o balcão e acendi outro.
Após terminar minha xícara de café subi até o quarto para verificar a situação em que se encontrava a pequena.
Em todo esse tempo a mínima cogitação de lhe chamar um medico não havia se quer ocorrido em minha mente, talvez pelo fato de que não poderia explicar por que um escritor que supostamente deveria estar falido e morto estava abrigando uma indigente que achará em um beco uma noite atrás.
Logicamente a idéia mais sã seria ter guiado a pequena até algum hospital ou coisa do gênero, até mesmo um hospício seria mais bem aceito do que a própria cama, mas minha mente bloqueava tais possibilidades, as anulava como que completamente improváveis por motivos que até mesmo eu desconhecia.
Enquanto minha mente divagava sobre as implicações de guardar tal fardo entre minhas cobertas, o mesmo apresentou leve movimento entre elas, subitamente seus grandes olhos castanhos se abriram e com terror fitaram todo o mundo a sua volta, como se os minutos anteriores não houvesse sequer existido o olhar da pequena cairá sobre mim, adiante-me suavemente em direção a cama, tentei, talvez inutilmente, manter minhas feições suaves assim como meus gestos.

- Não vou machucá-la. - Minhas palavras saíram suaves, sem nenhum toque de cinismo que pudesse assustá-la- Você foi despejada, encontrei seu corpo em um beco.

Seus olhos pareciam confusos, não se lembrava de nada.

- Está com fome?

Sua cabeça mecanicamente balançou negativamente ainda com o medo que explodia de cara poro de seu corpo.

- O que fizeram a você?

Subitamente lagrimas de puro pânico surgiram em seus olhos, seu pequeno corpo se encolheu ainda mais sobre a cama que agora parecia gigantesca em contraste a ele, era como se ela fosse cada vez mais engolida pelo pesado edredom que a cobria, lentamente sentei-me em um canto distante da cama, sem movimentos brutos idiota, sua boca se entreabriu e a suave melodia de sua voz agora me entoava os ouvidos.

-Alguém sabe que estou aqui?

- Não

- Quem é você?

- Julgando que você esta em minha casa, deitada em minha cama acho apropriado saber primeiro quem é você.

- Meu nome é Eliza.

- Bom Eliza, meu nome é Marcus.

- Obrigada, tem café?

- Claro, eu vou pegar isso e mais alguma coisa para você comer antes que desapareça.

Levantei-me e desci as escadas, o bule estava vazio, rapidamente acendi um cigarro e fiz mais um pouco do maravilhoso liquido negro, peguei algumas torradas e um pouco de geléia, era tudo que havia na geladeira, subi.
Ela repousava na cama com os olhos fechados, ressonava com o pesado sono em que havia caído, deixei em cima do criado mudo as torradas e a geléia, a xícara de café rapidamente esvaziei em um só gole, desci novamente até a cozinha enchi um copo com água e subi até o quarto, depositei o copo cheio ao seu lado e abandonei o recinto.
Olhei no relógio, quatro e cinquenta e sete, o tempo não passou, voou.
Caminhei preguiçosamente até a sala e fitei as botas sujas que continuavam no chão, me sentia cansado, recostei-me no sofá agora dando os últimos tragos que aquele pequeno cigarro me proporcionava, dia cheio; Pensei em andar até algum café pobre e arranjar algo para comer, mas meu corpo se recusava a executar todo e qualquer movimento, apesar da exaustão física minha mente trabalhava incansavelmente, tantos foram os pensamentos que me ocorreram que nenhum deles se fixara claramente em mim, de tudo que maquinava a única coisa que tenho recordação era de que precisava desesperadamente de outro cigarro.

20 maio 2010

Capitulo Um.

Meus passos seguem ecoando contra o frio concreto da calçada.

Sigo por ruas estampadas de sujeira e esquecimento, meus dedos roçam levemente as paredes, sinto os segredos e imundices as quais aqueles pobres tijolos já foram platéia.
Mulheres com a face excessivamente pintada e uma falta ignorante de roupas se escondem pelas sombras de ruelas, esperam silenciosamente por homens sedentos e embriagados que as usarão, sentem prazer com a rotina sórdida na qual se entregaram, gozam dos prazeres da imundice, aliviam-se no álcool, vêem a si mesmas como a podridão necessária da sociedade, orgulham-se por prestar favores tão árduos a nosso mundo.
Não permito meu olhar vaguear por tais corpos, resisto a todo e qualquer chamado que me atraia, fujo das tentações da carne abrigando-me sobre as quietudes do espírito.
Viro algumas esquinas, ando aleatoriamente por onde meus pés se permitem ir, finalmente sinto o silencio a me invadir, gozo do sentimento de solidão no qual me infiltro, meus dedos procuram o maço de cigarros em meu bolso, acendo o isqueiro, a pequena chama se faz claridade por entre a escuridão da rua, meus passos seguem continuamente, apesar de uma leve desaceleração quase imperceptível causada pelo efeito do tabaco que se prende a cada célula de meu corpo relaxando meus músculos pouco a pouco.
Alguns metros à frente ouço o barulho forçado de um pequeno cabaré, o cheiro de perfume barato e álcool se intensificam a cada passo, meus instintos naturais guiam-me até a porta, uma placa de neon vermelho tinge tudo ao seu alcance de rubro sangue, um homem forte e mal encarado repousa ao lado da pequena porta pela qual saem os gritos de excitação do pequeno publico que se encontra nos interiores de tal espelunca.

- Como vai ser camarada? Veio para ver a atração especial?

As palavras do homem, o qual a existência já parecia nula enquanto inconscientemente meus passos se cessaram e meus olhos vidrados fitavam a luz escarlate do neon que contornava as letras de meu desejo, me despertaram de tamanho transe que tomara por completo meus sentidos.

-Não obrigado, talvez na próxima vez- Mecanicamente obriguei meu corpo a ir em frente, o esforço de postar cada pé a um distancia mínima do local era quase insuportável.

-Tem certeza? Uma mulher dessas a gente não vê todos os dias.

Meus olhos então encontraram um cartaz pobre colado ao lado do homem, uma mulher já madura, porém bonita de cabelos loiros tingidos e sobrancelhas negras posava em um lingerie vermelha de um tom desbotado perto de seu batom chamativo sobre a pele morena de sol tinha curvas bonitas e um olhar sedutor, suas pernas estavam entreabertas e insinuava mostrar o pequeno e frágil sexo para os pobres trabalhadores que durante dias economizariam tostões do pão para ir ver tal mulher que os encarava no cartaz colado na decadente parede.

-Não obrigado.

Prossegui o caminho de meus passos, agora porem mais naturalmente, não era capaz de decidir se o sentimento que agora inundava meu peito era formado por decepção ou alivio.
Acendo mais um cigarro, essa merda vai acabar por me matar um dia, mas não vejo coisa melhor agora do que sentir a seca fumaça se espalhando por minha garganta e finalmente chegando a meus negros pulmões que filtrarão toda magia que aquele pequeno veneno despeja sobre mim.
O som do pequeno cabaré se afasta cada vez mais levando consigo o sabor da luxuria que me tentava os nervos.
A quietude era tanta que não sabia dizer se se passaram minutos ou horas, mas finalmente entrei em um pequeno beco que tinha como única fonte de luz um lampião que ficava exatamente no meio de seu percurso, hesitei em continuar pelos paralelepípedos mal colocados no chão, mas algo que ia alem de minha consciência fez minhas botas continuarem passo após passo, apesar de ser um homem pesado a lodosa umidade que habitava o chão tornava-me completamente silencioso, fazia parte das sombras agora e a única coisa que me destacava em meio a todo negro que me rodeava era a fraca claridade de uma nova bituca de cigarro que se acomodava gentilmente aos meus lábios.
Subitamente ouço o ronco de um motor a cortar o mortal silencio que repousava no ar, um carro negro vinha rapidamente em minha direção pelo beco, estava a poucos passos do circulo iluminado que o lampião projetava no chão, mas as sombras ainda guardavam-me como partes necessárias de si, instintivamente joguei o cigarro no chão apagando o único indicio de minha existência por entre tudo que me rodeava.
O grande carro, de modelo que não me transferiu nome algum a memória, parou exatamente sobre o circulo, se desse mais dois passos e esticasse minhas mão seria capaz de tocar o metal polido de sua carcaça, suas portas se abriram violentamente e de seu interior foi despejado um corpo.
As portas se fecharam e partiram junto com o motor que quebrava a paz de meu silencio, porem o pequeno corpo continuava jogado por entre as pedras lodosas do beco.
Seus cabelos de fogo cobriam-lhe as faces, a pele excessivamente branca contrastava contra a sujeira que cobria certas partes de seu corpo, estava sem roupa de baixo, usava somente um leve vestido azulado com um grande decote em renda, meus instintos gritavam em minha cabeça para que continuasse a andar, porem me dirigi até o circulo luminoso e coloquei meus dedos do lado esquerdo do pescoço da pobre criatura, não deveria ter mais de 18 anos, tinha um rosto bonito via agora que tirara os fios vermelhos de sua face, tinha batimento.
Ajeitei-lhe o vestido e tentei erguer-lhe do chão, era leve, seu peso quase insignificante em meus braços, sua inconsciência me perturbava, sai do beco e me dirigi ao centro da cidade, não avistei alma viva durante o logo percurso e o único som que era capaz de ouvir eram meus passos e a fraca respiração da pobre criatura aninhada em meus braços, me dei na mesma rua deserta da pequena espelunca que tinha como atração principal a loira de lingerie vermelha, um taxi esperava um senhor de meia idade com um paletó de segunda sair de seu interior para a luxuria que o esperava por trás da porta que se abria como uma boca entre a luz vermelha fiz sinal para que o motorista me esperasse e me apressei em direção ao pequeno carro.
Um homem de cerca de 40 anos, cabelos grisalhos, bigodes fartos e incrivelmente negros guiava o taxi, não me perguntara nada da pequena, apenas me levara até o endereço que soturnamente lhe disse, ao final da corrida joguei uma nota de 50 no banco da frente e lhe disse que ficasse com o troco.
Entrei pela porta de madeira, o silencio reinava por entre tudo que me cabia a vista, subi as escadas até meu quarto, repousei o pequeno corpo sobre a cama, haviam algumas cobertas no armário, abri as portas e encontrei um velho edredom que não via há anos, agarrei o tecido semi puído e cobri a massa de carne e ossos que respirava calmamente.
Desci até a sala, não tive coragem de acender luz sequer, no breu acendi um cigarro e me servi de um copo de algo forte, o liquido quente me desceu a garganta revivendo tudo que jazia morto e frio dentro de meu corpo, joguei meu peso sobre o velho sofá tirei as botas enquanto terminava o cigarro, procurei pelo maço novamente, vazio.
Fechei meus olhos e cai lentamente na inconsciência.

04 maio 2010

Dezessete e Vinte.





Abro os olhos.

O azul degradante do céu aos poucos some sobre suaves nuances rosa e lilás.
Minhas mãos inutilmente procuram teus dedos na curta extensão de cama que se amplia por trás de minhas costas.
Já é tarde.
O relógio marca dezessete e vinte; O tempo para.
Sentada sobre os lençóis meus olhos rondam o quarto em busca de vestígios teus, um pequeno papel amarelo repousa relaxadamente sobre o pequeno criado mudo, noto amargamente tua caligrafia apressada e feia.
Meus olhos lêem e relem a pequena frase estampada sobre o fundo chamativo milhares e milhares de vezes.
Passa-se um segundo.

- "Perdoe-me, mas já não sou capaz. Adeus."

Meu coração congela e para assim como o tempo.
Mais um segundo.
Permaneço catatônica com o pequeno Post-it pousado na palma de minha mão aleatoriamente jogada sobre a cama.
Passam-se dias.
O ponteiro vira mais um segundo.


Abro os olhos.

Encaro o monte que dorme silenciosamente diante de mim.
Com as cobertas puxadas até a cima da cabeça teu sono divaga por mundos abstratos e pacíficos que nada tem de realidade.
Já é tarde, dezessete e oito.
Noto um pequeno papel amarelo sobre o criado mudo.

-"O tempo é eterno assim como meu amor por ti."

Rasgo minimamente o papel e atiro suas réstias pela janela a qual largo aberta com o cortante vento entrando e esvoaçando glacialmente as cortinas.
Beijo-lhe a nuca sobre a grossa camada de tecido que lhe protege.
Teu corpo não sofre nenhum movimento, tua respiração aconchegante prossegue mecanicamente.
Meus dedos agarram outro Post-it idêntico ao que despedacei.

-"Perdoe-me já não sou capaz. Adeus."

Rapidamente jogo-o sobre o criado mudo, com medo que talvez meus movimentos lhe despertassem.
Sempre amei tua mania de deixar-me pequenos recados espalhados pela casa durante tuas eventuais ausências.
Pego algumas coisas e saio.
Sinto que o baque da porta lhe acordara; Talvez seja apenas minha consciência.
Olho para o céu, para uma bonita tarde gélida que agora banha-me o rosto com teus doces aromas de podridão.
Olho o relógio.
Dezessete e vinte.
Ando durante algum tempo sem rumo por ruas que antes me soavam tão familiares.
Ando por um mundo estranho, por algo novo que já me fora tão normal.
Meus pés param sobre a calçada; Chamo um taxi.
A noite já caíra, culpo-me dolorosamente por não ter lembrado de pegar um casaco.
De não ter fechado a janela.

- Para onde senhor?
-Como?
-Para onde senhor?
-Desculpe, mas, do que me chamou?
-Senhor, por que algum problema?

Vejo de relance meu reflexo no espelho retrovisor.
Saio do taxi, deixo tudo que trazia comigo, mas no taxi só ficara minha pequena maleta e os ecos dos distantes gritos do taxista que me lembram de tal objeto.
Corro novamente pelas mesmas ruas; Ruas as quais segundos atrás me eram tão indiferentemente estranhas, mas que agora riam de meu súbito desespero.
Paro.
O cansaço e as facadas que o ar gelado da noite produz sobre mim me fazem tombar.

Abro os olhos.

Olho o céu que já escurece em volta de tudo que me cabe a visão.
Já é tarde.
Dezessete e vinte.
Olho para os lados, nada.
Um pequeno papel amarelo atrai minha atenção no quarto seminu e despido de cores fortes.
Não tenho coragem de arrastar-me até o pequeno criado mudo, perco totalmente toda minha força, não me mecho, muito menos respiro.
A porta bate.
Instantes depois teu corpo se junta ao meu na cama, teu semblante encontra meu toque sedento.
Sinto as marcas que o frio fizera em tua face, sinto partes úmidas perto de teus olhos.
Teus dedos escorregam até o chamativo Post-it e o rasgam.
Teus pequenos pedaços voam janela a fora, o vento que até este instante não tinha notado se interrompe abruptamente quando teus braços escorregam pelas laminas de vidro fechando-as.
Teu corpo forte encontra o meu novamente da pequena cama.

-Por que você fez isso? Não havia lido aquele ainda.
-Não eram nada, apenas algumas anotações bobas- Tua voz quase imperceptivelmente se altera à minha observação.
-Hum, já volto, vou pegar algo para comer na cozinha estou faminta.
-Deixe que eu vá.
-Não!- Recupero o controle sobre meu tom - Não sei bem o que quero e alem do mais você esta congelando, vá tomar um banho.

Teu doce riso flutua até mim aquecendo-me por dentro.

-Está bem, mas sob a condição de que você ira se juntar a mim.

Esboço meu melhor sorriso e lhe digo que é uma condição mais do que justa.
Enquanto teus passos lhe guiam até o banheiro encontro os últimos vestígios de coragem dentro de mim.
Ouço o baque surdo da porta e instantes depois o ruído suave da água quente caindo sobre os ladrilhos.
Agarro meu casaco, minha carteira e minhas chaves; Saio.
Ando por minhas ruas, não passo de uma insignificância diante de tudo que vejo.
Meus braços se levantam fazendo sinal para um taxi que passava.

-Para onde senhora?

Suspiro ao escutar aquela voz tão rude a dizer palavras tão educadas a meus ouvidos, palavras agora dirigidas a mim.

-Não sei bem.

Sinto o olhar confuso do homem que me encarava sobre os ombros enquanto saia calmamente do taxi
Sigo o caminho por aonde meus pés levianamente me conduzem.
Olho a frente.
Estou em casa.
Penso em ir até a porta, entrar, correr até o quarto me infiltrar em teus braços, e mentir aos teus olhos cansados.
Sigo em frente.
A luz do que um dia chamei de lar cada vez mais fraca sobre o longínquo horizonte.
Sinto tudo que deixe para trás.
Continuo em frente.