"Existem Venenos Tão sutis que, para conhecer-lhes as propriedades, temos que nos expor ás doenças que causam."

Oscar Wild.

06 fevereiro 2012

Seven Devils.

E agora depois de meses abro novamente o bloco de notas, não sei se é uma estranha coincidência ou se as palavras só me vêm à mente quando esta não esta em seus melhores dias, pode ser aquela velha maldição dos românticos do século dezoito que molhavam as respectivas penas no tinteiro para derramar sobre os papeis suas infindáveis dores e pesares sobre as damas vivas ou gélidas em seus túmulos e a escuridão que os rodeava, a depressão daquela época ainda reina nos loucos que se aventuram a soltar no mundo seus demônios.
 Os meus demonios ontem foram tristes, hoje são melancólicos.
Não digo que tive meses de alegria e por isso não encontrei meios de vir e meter a cara numa tela em branco até me sentir satisfeita, não, foram meses bons, mas nem todos os mares só têm as pétalas, os meus principalmente vêm afiados com os espinhos.
Veio ano passou ano e a vida desta pobre escritora mudou drasticamente, abandonei muita gente no caminho, me apeguei com excesso a outras, juntei casais, quase separei outros, arrumei um emprego, engordei mais quilos do que meu guarda roupas poderia contar, foi tudo, e quando me deparo com situações de três, quatro meses atrás, tudo parece tão surreal, tão novelístico comparado aos dias que eu tenho hoje, cama, casa, trabalho, casa, cama, uma trama perfeita de filme francês que levaria seu expectador ao mais puro estado de coma logo após os vinte minutos iniciais.
Mas vamos aos demonios, são demonios realmente tristes, demonios cansados, assustados, levemente raivosos, e estes mesmos me sobem a garganta pedindo licença, com toda educação que lhes dei, e me quebram os maxilares procurando espaço, retendo uma golada de ar antes de caírem em tela e serem apertados contra um notebook fervente que insiste em causar queimaduras de terceiro grau nas coxas de sua dona.
Todos somos cheios deles, não dos notebooks assassinos, mas sim dos demonios, os meus apesar de repetidos, são bem diversos, gosto de separar as categorias: Demonios que crio por causa de filhos da puta, e Demonios que crio por mim mesma, é incrível como os interligados ao setor externo de filha da putagem são muito mais numerosos.
Posso não ser o exato estereotipo de gente depressiva, que se instala nos cafés da paulista com uma echarpe, lendo os clássicos durante horas, só pra depois poder criticar a forma de escrita do autor alegando que a mesma é "pouco refinada para os moldes da época", sou triste, mas de uma tristeza reprimida, sou triste sem ser, ao mesmo tempo em que sou não sou, sou um eterna abobalhada que chora por alegrias e ri de tristezas, uma maldita sadomasoquista sentimental, uma garota completamente normal que raramente deixa as pessoas saberem disso.
Mas tenho que assumir, sou teatral, fui feita para o drama, as lágrimas me são tão naturais que já se tornaram velhas amigas, um de meus maiores talentos é derrama-las, todo aquele drama trancado, drama hormonizado, drama triste, escorrendo pelas bochechas de pele macia, manchando o veludo rosado que poderia estar rindo cinco minutos antes, mas apesar de dramática, sou uma dramática pacifista, choro quieta, solto meus demonios e depois vou me aconchegando com quem não quer nada para um abraço, uma dramática carinhosa meus senhores e senhoras, relevo a maioria das coisas e vou voltando ao normal logo depois de explodir em um frenesi louco de palavras molhadas e esse drama encaixotado, amarrotado e escarrado é um de meus demonios, e quem não o tem? O ser humano descobriu bem antes de ler Shakespeare seu quê de drama, em todos os amores com gosto de sangue, o homem aprendeu a dramatizar o amor e eternizar o drama entre beijos envenenados.

Ao fim, cada um tem seus demonios, alguns são sagrados e aparecem em formas de Deus, outros te encontram em um copo de cerveja gelada as oito em uma noite quente no bar da esquina, alguns você guarda, outros se desgastam, são todos demonios, procurados ou achados, amigos ou traidores, demonios que temos que levar, que nos recheiam, que nos matam ensinando assim que a gente tem que viver, demonios vivos, outros imaginarios mas não menos vivos, são demonios que não vão embora com uma dose de cachaça, são demonios que vão, todos demonios, todos meus, seus, todos feitos exatamente a minha imagem.



Holy water cannot help you now
A thousand armies couldn't keep me out
I don't want your money
I don't want your crown
See I have to burn your kingdom down

Holy water cannot help you now
See I've had to burn your kingdom down
And no rivers and no lakes can put the fire out
I'm gonna raise the stakes
I'm gonna smoke you out

Seven devils all around you
Seven devils in my house
See they were there when I woke up this morning
I'll be dead before the day is done

Seven devils all around you
Seven devils in your house
See I was dead when I woke up this morning
I'll be dead before the day is done
Before the day is done

And now all your love will be exorcised
And we will find you saying it's to be paradise
And it's an even sum
It's a melody
It's a battle cry
It's a symphony

Seven devils all around you
Seven devils in my house
See they were there when I woke up this morning
I'll be dead before the day is done

Seven devils all around you
Seven devils in your house
See I was dead when I woke up this morning
I'll be dead before the day is done
Before the day is done
Before the day is done
Before the day is done

They can keep me high
'Til I tear the walls
'Til I save your heart
And I take your soul
And what have been done
Cannot be undone
In the evil's heart
In the evil's soul

Seven devils all around you
Seven devils in your house
See I was dead when I woke up this morning
I'll be dead before the day is done
Before the day is done

01 fevereiro 2012

01/02/2012

Hoje meu texto não é uma exibição carismática de dor.

Por uma palhaçada do destino, hoje me vi correndo para chegar a uma audiência que se quer era minha, a grande maioria de vocês não sabe nada de mim, tirando o fato de algumas palavras e aos mais atentos meu nome ao fim do blog, para os que não estão familiarizados, eu sou estudante de direito, faço estagio em um escritório na Avenida Paulista em São Paulo, a famosa paulista onde há boatos que até mesmo os mendigos são mais glamorosos, na minha honesta opinião, toda merda fede igual, até mesmo a perfumada em essências francesas.
Vou ser bem honesta, não sei como seguir, nem mesmo como fazer este texto, não sei nada, ou melhor, sei, sei que ele tem que sair de um jeito ou de outro.
Hoje quando cheguei com meus poros chorando suor frio a pequena sala de espera do segundo andar do juizado especial cível de são Paulo, me sentia feliz, orgulhosa até, de ter corrido e chego a tempo de fazer aquilo para que fui designada de ultima hora, me deixei cair em uma das poltronas de espuma fofa e esperei a audiência que chegou, mas muito mais atrasada do que eu.
Enquanto esperava ainda orgulhosa de meu feito, havia realizado o percurso do Trianon até o juizado em cerca de 15 minutos, a custo de muitos empurrões, licenças e maldições, mas estava lá, limpando meus óculos borrados pelo calor e me abanando o melhor que conseguia com a pasta que havia trazido com a defesa, em um de meus olhares que lancei pela sala me vi fitando o documento da senhora que sentava ao meu lado, era a autora que movia a ação contra o cliente do meu escritório, uma senhora de cerca de sessenta e poucos anos, com os cabelos tão ralos que era possível ver o couro cabeludo brilhando sobre a fina camada negra que o cobria, uma dentadura escura e mal feita na boca, óculos pequenos que cobriam olhos gentis, trajava uma blusa Pink combinando com o batom e algumas poucas joias.
Aquela não era minha primeira audiência, não posso dizer que estava acostumada a lidar com a parte contraria de um processo, mas não era exatamente uma virgem do processo.
Quando entrei na sala bem iluminada envergonhada do estado em que se encontrava minha identidade, que estava realmente em uma situação lamentável, mal sabia que sairia de lá muito pior, me sentei ao lado direito da mesa representando o requerido e assim começou a audiência.
Em um relato breve o caso era sobre movimentações na conta corrente da autora que a mesma não reconhecia a soma retirada sem consentimento dela foi de exatos mil e quinhentos reais, nossa defesa, que posso dizer que estava porcamente elaborada, não por incompetência do advogado, mas sim por que era explicitamente um caso de fraude de cartão, até mesmo um leigo perceberia, sendo apresentados os fatos a juíza em questão, o qual a graça não merece menção, começou a sentenciar aquele fatídico caso, sei que não sou uma bacharelada em direito, ao contrario, sequer consegui passar do primeiro ano ainda, mas ao decorrer das palavras da juíza fui vendo que esta, maldita, dizendo-se de passagem, estava dando como improcedente a ação, a pobre senhorinha que estava de frente pra mim, me olhando nos olhos e murmurando de vez em quando que era muito difícil perder aquela quantia de dinheiro, mal suspeitava de que se tratavam as palavras da mulher que sentenciava a pequena causa dela, ao fim da audiência aqueles olhos gentis e confusos sequer entenderam que haviam perdido a causa, saíram desamparados procurando uma advogada que ficava para auxilio na sala de espera para desvendar o que havia sido feito com seu pedido, enquanto ela que sequer havia entrado acompanhada de um advogado, saia confusa, também saia eu com a cabeça pesada de culpa, não fui culpada daquela pobre senhora ter perdido a ação, sequer o escritório em que eu trabalhava, o próprio banco, quem eu estava representando na audiência não tinha uma culpa latente no desenrolar dos fatos, a partir do momento em que ambas tínhamos adentrado a sala de audiência, uma juíza sem senso nenhum de justiça havia de proceder no papel de deus, sim, aquela pequena mulher, trajando meias finas de cor creme e sandálias de plástico pretas, um visual extremamente brega, como se pode notar, ainda mais para uma mulher do porte daquela, aquela mulher tinha nas mãos o poder da justiça, provavelmente é para chegar aonde ela chegou que muitos alunos prestam todos os anos vestibular para entrar em uma faculdade de direito, para ser por poucos momentos em um dia, aquela velha deusa da justiça, com uma balança em uma mão e uma espada na outra, vendada e serene, e exatamente aquela mulher virou as costas para tal justiça.
Sei que não fui culpada, mas ver a bondade e a confusão nos olhos daquela senhora me fizeram um monstro aos meus próprios olhos, pensei como tudo podia ter dado errado, o metrô parado, eu podia não ter chego, nós podíamos ter perdido a causa por revelia, mas infelizmente deu tudo certo, cheguei a tempo, orgulhosa de meu feito, que tanto me causou pesar depois.
Na verdade não cito nenhum nome, pois nenhum é importante nessa historia, nem mesmo o meu, escrevo ela pra tirar de mim essa sensação gasta de fragilidade, essa culpa que me corrói sem ser minha, o que aconteceu hoje me fez perder muita fé naquilo que sempre sonhei fazer, para os que não sabem também desejo ser juíza, vi que nem sempre a justiça é justa, vi que nem sempre ela se encontra nas mãos de quem é merecedor dela, mas ao mesmo tempo em que tive vontade de deixar aquele mundo que constituía uma justiça tão vazia, tive certeza que era aquilo que lutaria até o fim para conseguir, não para reparar os danos que ficaram marcados hoje, mas para dar a justiça alguém que tente ao seu máximo prevenir essa justiça vazia que transforma grandes empresas em lobos fantasiados de cordeiro e onde olhos gentis perdem a fé.
Assumo que chorei relembrando os olhos daquela senhora, acho que todo aluno que sonha em fazer direito deveria passar por isso antes, pela experiência de ver a justiça a qual ele estuda e aprende a amar sendo destruída, vendo a bondade sendo dizimada e jogada de lado, ter a sensação de ser um monstro quando sabe que defende a parte errada, ver alguém inocente não entender o porquê a justiça que deveria ser suprema lhe deu as costas, não são todos que aguentariam o que eu senti hoje, muitos não sentiriam nada e mal se lembrariam deste dia.

Eu vou lembrar.