Ele abriu os olhos, se sentia estranhamente vazio, não sabia mais discursar sobre o amor, muito menos sobre a dor, era apenas mais um rabiscando palavras aleatórias em um papel qualquer que no fim do dia estaria entre toneladas de lixo em meio a algum devaneio perdido.
Ela abriu os olhos, se sentia estranha, uma mistura de dor com uma pontada de decepção, não sabia mais discursar sobre a dor que sentia ou que às vezes se fazia sentir, muito menos sobre o amor, digitava algumas palavras no bloco de notas do computador para depois apagar e continuar a pensar sobre como perdera todo talento que já teve um dia.
Ele inventava historias sobre si mesmo para apagar o vazio que insistia em ficar.
Ela apagava as historias que inventara para se sentir um pouco melhor com a fria realidade.
Ele estancou e permaneceu no mesmo degrau.
Ela despencava por muros que foram construídos por suas próprias mãos.
Ele se trancava.
Ela procurava a chave.
Ele se calava.
Ela sorvia do silencio com um sorriso letal nos lábios secos.
Ele continuava.
Ela reabria os olhos se vendo como ele.
Ele fechava os olhos e se sentia como ela.
Ela se contorcia em troca de poucas migalhas.
Ele as atirava com os punhos fechados criando rajadas de falsas sombras sobre o piso frio e sujo.
Ela corria em vão.
Ele propunha os obstáculos.
Ela se feria.
Ele lambia as feridas.
Ela se cansou.
Ele voltou a brincar.
Ela enfim desistiu enquanto ele a forçava a jogar.
Ele sorria ao ver a falsa esperança.
Ela fingia para fazê-lo sorrir.
Ele morria em meio ao fogo.
Ela alimentava seus pesadelos.
Ambos viviam sem saber nem por um segundo que eram na verdade a mesma pessoa.